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Posts Tagged ‘Calendário’

Aconteceu no dia que, meio a contra gosto, completei mais 365 dias desse calendário ingrato.
Acordei com a sensação de que o mundo é líquido. Cama, guarda-roupa, abajur. Tudo ao redor me pareceu frágil, irreal.
Foi então que notei, passarinho na janela cantando anunciava auroras.
A revelação caiu sobre mim como água de cascata.
Pesada, certeira, cruel…mas que deixa marcas na pele.
Os dias passam rápidos, as estações dançam em roda e os anos não são nossos.
A flor que hoje captada em sua beleza, desaparecerá.
Esses homens que caminham em silêncio, assim fazem por medo de revelarem suas almas. Vestem solidão como capa para proteger de tempestades.
Os que rezam terços e curas estão tentando forjar o mundo em suas caixinhas de jóias e manuais de sobrevivência.
Apressa-te pois não há muito tempo.
Eis o machado em sua mão direita para ferir a superfície de hipocrisia e trivialidades.
Leva também contigo água fresca e pão para alimentar-se apenas de simplicidade.
E cobre tua cabeça com poesia. Quem sabe um dia enxergará o Altíssimo.
E enquanto caminha, entrega-te sem reservas. Vai os poucos doando aos suplicantes aquilo que tanto segurou em tuas mãos.
Nunca negue um abraço.
Beija como quem cumpre a única lei necessária.
Nunca preguiçoso, se permita frívolo ou companheiro da moral envelhecida.
Que a verdade seja a única luz que ilumina seus passos.
E a bondade a vela que não te deixa no escuro.
Não precisará mais de unções, galardões ou paraísos celestes.
Tua salvação virá ao se desfazer pelo caminho.

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A mim que desde a infância venho vindo

como se o meu destino

fosse o exato destino de uma estrela

apelam incríveis coisas:

pintar as unhas, descobrir a nuca,

piscar os olhos, beber.

Tomo o nome de Deus num vão.

Descobri que a seu tempo

vão me chorar e esquecer.

Vinte anos mais vinte é o que tenho,

mulher ocidental que se fosse homem

amaria chamar-se Eliud Jonathan.

Neste exato momento do dia vinte de julho

de mil novecentos e setenta e seis,

o céu é bruma, está frio, estou feia,

acabo de receber um beijo pelo correio.

Quarenta anos: não quero faca nem queijo.

Quero a fome.

– § –

Esse é um daqueles textos que, de forma abrupta, nos provocam uma admiração misturada com inveja, pelo desejo de reivindicar sua autoria. Quisera eu ter escrito, pois ele traduz o que sinto todas as vezes que a fatídica data martela mais um ano em meu calendário particular.

Ainda não fiz quarenta anos, mas certamente ainda escolho a fome à faca.

 

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